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Madrigais

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Ricardo Louro - Madrigais

Detalhes

No horizonte da minha memória desenha-se com clareza a figura do Ricardo com os seus dez ou onze anos, quando fui sua professora pela primeira vez. Tez clara, esguio, de olhos profundos e magoados… Era muito diferente dos outros colegas e também muito especial. Sentia-lhe uma sensibilidade à flor da pele, esforçadamente contida e dissimulada por uma candura de criança traída pelo destino. Não era um menino de lágrimas, não, mas o seu rosto encontrava-se cheio delas, escondidas! No sótão dos meus sentidos encontrei muitas lembranças, relíquias que guardei mas, as que abri com mais fervor foram a sua CORAGEM e o seu poder de SEDUÇÃO. A sua CORAGEM férrea, inquebrantável, num misto de orgulho e arrogância, deu-lhe a firmeza de espírito para enfrentar tantos momentos difíceis e força para sobreviver à crueldade com que outros, até os demais da sua idade, estúpida e impiedosamente tantas vezes o maltrataram. A todos respondia com o seu silêncio, um silêncio ensurdecedor. O silêncio é um dos argumentos mais difíceis de se rebater! Sempre o imaginei um estrangeiro, a quem todos os punhais do destino estavam cravados nas suas costas. Muitas foram as vezes que lhe observei um nó na garganta pelos escolhos que engoliu nessa infância mal fadada… “Eles nunca me sentiram… eles nunca me entenderam…” Nunca o vi explodir nas palavras escritas, que manteve difusas e opacas. Nunca através delas me revelou a sua alma a sangrar, nunca me contou os seus segredos, nunca me falou dos seus medos, que eu lhe adivinhava… Sem ter amigos, sem que ninguém o acolhesse no coração, o Ricardo aprendeu que as palavras eram muito mais que punhais. As palavras podiam ser mágicas, podiam exorcizar medos e transformar a sua alma soturna. Aproximava-se de mansinho de quem gostava, seduzia quem sabia poder conquistar, insinuava-se e, as palavras que usava, por vezes brejeiras e marotas eram sempre gentis, lisonjeiras, galanteadoras. Usava-as para acarinhar, abraçar e beijar. Multiplicava-se em mil delicadezas mas, o seu olhar e o seu riso dissimulavam o poder invisível que lhe ensinara a respirar para dentro e a controlar o bater do coração. Devorado pelo seu desejo de ser amado, a SEDUÇÂO era a sua arma, era a sua forma de dizer: - Reparem em mim!!! Eu estou aqui, eu sou gente, AMEM-ME! Este menino que nunca brincou num recreio, por não ter com quem, refugiava-se na biblioteca da escola durante todos os intervalos. Aí evadia-se, quiçá sonhava … As palavras que então lia e o reconfortavam, deixaram eco no seu coração, invadiram-lhe a alma de cristal, mitigaram-se a dor de ser quem era. Um pronuncio de um Ricardo poeta que, devastado pela amargura, sentiu despontar de dentro dele uma luz, uma chama, um apelo! E como um condenado que cumpre uma pena, saía deste refúgio, que o acolheu durante anos, ao ouvir o toque da campainha que lembrava o reinício de mais outra aula. Com o passar do tempo, um Ricardo já menos menino, antes um jovem mais alto e franzino, mas com a mesma inquietação no olhar, esperava invariavelmente por mim no topo das escadas… e íamos conversando enquanto nos dirigíamos para as salas… Essa estreita janela de tempo abria-se para um jardim com inúmeros recantos: verdejantes, sombrios, lúdicos, oníricos… Fomo-los percorrendo e, de forma aleatória, sentámo-nos à sombra das árvores, bebemos água das fontes, apreciámos a beleza e as cores das flores, sentimos frio e medo, enternecemo-nos com o pôr do sol, andámos de baloiço, rimos, rimos à gargalhada, … Cúmplice desses momentos de proximidade, observava-o na sua tentativa de sacudir o cansaço de carregar o seu próprio FADO. E assim fomos vendo o tempo a passar, a passar… Embora não lhe tivesse de todo perdido o rasto, por razões que se prendem com o tempo ou com a própria vida, só volvidos alguns anos nos voltámos a encontrar na Casa de Fados Bota Alta em Évora. “Tantas voltas dá a vida, tantas vidas dão a volta!” Vi-lhe, com surpresa, uma centelha de luz a iluminar-lhe o olhar, novos gestos, um porte mais polido e estudado, uma estrutura moldada pelo peso dos fardos bons e ruins. Este Ricardo já homem, revelava a força que vem do aprendido. Aprendera com as histórias dele, as dos outros, as dos filmes, as dos livros, as que se contavam na mesa ao lado… Soube-o POETA! Emudeci, quase desacreditei… ou talvez não! Sabia, sentia, tinha a certeza que guardava sonhos e segredos que durante muito tempo aprisionara. A sua coragem vencera os seus temores, permitindo-lhe escrever o que sentira, o que sentia. Com a alma cristalizada pela nostalgia dos sonhos e o coração de cinza pisada que resistira sem quebranto aos golpes dum destino atormentado, agitou os seus fantasmas, amaldiçoou-os, mordeu-lhes cantando e, pedindo-lhes tréguas, adormeceu com eles com complacência. Senti-o apaziguado, fizera as pazes consigo próprio, tornando-se mais amigo de si mesmo. Do seu coração tantas vezes dilacerado, deixou que brotassem emoções imensas que pareciam guardadas desde tempos remotos. Nos seus versos as palavras fluíam em catadupa, intensas, ritmadas, como se o mar antigo lhe tivesse trazido marés ocultas mas renovadas, cujos destroços lhe revelassem o sonho indelével das sereias. Do mais fundo de si deixou que explodissem folhas pisadas, pétalas secas pelo tempo e flores transparentes salpicadas pelo arco-íris que trespassa o horizonte após a tormenta. Na sua exaltação aconteceu POESIA! Da dor nasceu um POETA! Da dor nasceu um POETA, intenso, profundo e, ser POETA é, como dizia Florbela “ ser mais alto, é ser maior…” O Ricardo revelou-se um exímio artífice na arte de poetizar, um príncipe das nuvens, incapaz de conter os seus segredos, exprimindo nos seus poemas aquilo que um dia pensou guardar só para si. É um pássaro a quem a menor coisa o faz cantar, um artista que ama a sua arte, um pintor de palavras cuja memória fundida nas memórias, ilumina as telas brancas com a sua inspiração. Se as inúmeras dificuldades e amarguras que enfrentou no passado o não detiveram, agora, POETA já reconhecido e consagrado, tem o mundo de apreciadores da sua verve aos seus pés! Com muito carinho e um imenso orgulho pelo trilho que alicerçou e vem percorrendo, desejo ao Ricardo as maiores venturas e felicidades para o seu futuro, que adivinho bem consolidado, muito promissor e merecido. Maria do Céu Cabreirinha

Informação Adicional

Nome do Autor 1 Ricardo Louro
Nome do Autor 2 Ricardo Louro
Editor Não
Tipo de Papel Branco 80 gr.
Formato 140x210
Tipo de Impressão Cor
Tipo de Encardenação Capa Mole
Número de Páginas 255